Monday 24 February 2020

A CAÇA ÀS BRUXAS (9)

ANTECEDENTES (3)

A AFL
A AFL-CIO
A AFL-CIA...

Ao mesmo tempo que liquida o seu carácter de classe e democrático, a AFL entra no mundo dos negócios: com o dinheiro dos associados compra terrenos e empresas, torna-se sócia de bancos e de grandes empresas. A dada altura, detém 13,7% da Holliday Inn, 13,6% da Texas Instruments, 12,9% da McDonalds, 12,8% da K Mart, 12,6% da Delta Air Lines...

A situação entretanto criada gerava descontentamento e revolta no seio da AFL. A dada altura, surge uma tendência visando combater o estado das coisas, com a criação da Liga Educacional Sindical - que viria a ser rapidamente neutralizada com a expulsão e a prisão dos seus activistas, ao abrigo do «estatuto anticomunista».

E só em 1938, no quadro do forte movimento de greves operárias então em curso, um grupo de dirigentes sindicais rompe com a AFL e funda o Congresso das Organizações Industriais (CIO).
Esta foi a primeira grande resposta à degradação da AFL, à sua traição de classe, ao seu racismo.
O CIO adquire de imediato grande influência.
É evidente o contraste entre as posturas das duas centrais: por altura da II Guerra Mundial, enquanto «a AFL financia e organiza apoios de diversa ordem a Hitler e Mussolini, o CIO integra um movimento anti-nazi» e, após a Guerra, toma parte activa na criação da progressista Federação Sindical Mundial (FSM).
Nesse tempo a AFL perde influência junto dos trabalhadores - mas «mantém o apoio do grande patronato e da extrema direita política, organizada no Partido Republicano e em sectores do Partido Democrático».

Todavia - repito! - o grande capital não dormia. Nunca dorme.
E na intensa campanha anticomunista desencadeada após o fim da Guerra, o CIO era um alvo a abater.
Já aqui se disse que, entre os milhares homens e mulheres que integravam as «listas negras» do fascista MacCarthy, figuravam muitos sindicalistas. Além disso, a AFL apoiava e colaborava na Caça às Bruxas...
A operação contra o CIO desenvolve-se em duas linhas paralelas e complementares: por um lado, o grande patronato recusa negociar com os sindicatos filiados no CIO; por outro lado, repete-se na nova central o esquema utilizado anteriormente na AFL: perseguições dos sindicalistas mais destacados, que são acusados de «comunistas» e presos - é a caça às bruxas no movimento sindical.
Apesar disso, em 1946, o CIO lidera as grandes greves (com ocupação de empresas) na indústria automóvel - ficando célebre a greve de mais de 100 dias na General Motors.
Mas a ofensiva contra a central era muito forte, organizada e persistente e, a dada altura, «alguns dos dirigentes mais influentes do CIO começam a ceder»...
Acresce que, em Junho de 1947, o Congresso dos EUA aprova a lei Taft-Hartley: uma «lei de carácter anti-sindical e anti-greve»...
E um ano depois o CIO decide «adequar os seus estatutos à nova lei».
Os sindicatos que rejeitam a decisão e que mantêm nos seus estatutos «a luta contra o capitalismo» - sindicatos que representam um milhão de trabalhadores - são expulsos da central.
Logo a seguir, o CIO afasta-se da FSM - e o seu tesoureiro, James Casey sintetiza assim a nova posição da central: «No passado unimo-nos aos comunistas para lutar contra os fascistas, mas numa outra guerra unir-nos-emos aos fascistas para lutar contra os comunistas».
E agindo em consonância com o que disse «expulsou do CIO todos os sindicatos progressistas e de classe».

Recorde-se que, enquanto tudo isto acontecia, a Comissão de MacCarthy intensificava a Caça às Bruxas: Dashiel Hammett, John Garfield, Dalton Trumbo, etc, eram submetidos aos interrogatórios da Comissão - e Julius e Ethel Rosenberg eram presos e, a seguir, executados.

Em 1955, a AFL e o CIO juntam os trapinhos...
O primeiro presidente da AFL-CIO define assim a linha político-sindical da nova central: «Nós cremos no sistema capitalista. O nosso objectivo é a preservação do capitalismo que não queremos trocar por nenhum outro sistema».
Palavras para quê?: é um dirigente do sindicalismo «livre» e «independente» em acção...

Nos anos que se seguiram, a AFL-CIO mostrou o que valia, apoiando todas as acções belicistas do Governo dos EUA - da guerra do Vietnam ao bloqueio a Cuba...
«Sindicalistas» da AFL-CIO participaram na preparação do golpe de Pinochet (na organização da greve dos camionistas) e no golpe militar fascista de 1 de Abril de 1964, no Brasil.
William Doherty, dirigente da central, disse sobre essa participação: «O que aconteceu em 1 de Abril de 1964 não foi obra do acaso: tudo foi planeado com meses de antecedência e nessa planificação tiveram papel importante muitos líderes sindicais treinados pela AFL-CIO, os quais estiveram profundamente envolvidos no golpe».
Registe-se que William Doherty «fazia parte da folha de pagamentos da CIA» - e tão estreita e óbvia era a ligação da AFL-CIO à CIA que, a partir de certa altura, a central passou a ser conhecida por AFL - CIA...

Com a criação, em 1949, da Confederação Internacional dos Sindicatos Livres (CISL), as duas centrais passaram a colaborar estreitamente numa versão da «caça às bruxas» adequada ao novos tempos: a promoção do divisionismo sindical, tendo como objectivo essencial a liquidação dos sindicatos de classe e a promoção do «sindicalismo livre».
Nessa acção têm dedicado particular atenção à «formação sindical», através de «cursos» realizados por todo o mundo...
Quem acompanhe com um mínimo de atenção a vida sindical portuguesa, dará conta da realização regular de tais «cursos» no nosso País...

Aliás, o que se passou - e passa! - em Portugal é um exemplo perfeito do conteúdo da intervenção dessas centrais do divisionismo:
«São conhecidas as ingerências de centrais sindicais internacionais, pela mão de Mário Soares, na vida sindical portuguesa: a CISL, com o seu "escritório" montado em Lisboa logo a seguir ao 25 de Abril e com os seus "seminários de formação sindical"; a norte-americana AFL-CIO, que aqui começou a trabalhar logo a 27 de Abril de 74 (reunindo clandestinamente com quem Soares muito bem sabe...) e que, a dada altura, informava no seu jornal, num linguajar nada sindicalista, que "houve conversações em Washington com as lideranças dos dois mais importantes partidos portugueses"; que "estabelecemos contactos com o movimento sindical português"; que "sindicatos e partidos políticos não comunistas da Europa ocidental têm estado activos em Portugal a fim de corrigir as distorções a que o movimento sindical foi submetido pelos comunistas" - e a AFL-CIO garantia uma "ajuda sem limites" ao divisionismo sindical em Portugal. Via Mário Soares, obviamente».
Foi assim que - apadrinhada, benzida e, sobretudo, financiada pela CISL e pela AFL-CIO - nasceu a UGT.