Thursday 6 February 2020

A CAÇA ÀS BRUXAS (3)

«A LISTA NEGRA»

No dia seguinte à condenação dos Dez de Hollywood, em 25 de Novembro de 1947, a Comissão de Actividades Anti-Americanas anunciou a primeira «Lista Negra» de cidadãos norte-americanos suspeitos de simpatias comunistas e, portanto, «antipatriotas» e «traidores» que preparavam «um complot para derrubar o governo dos EUA»...

Muitos eram ligados à indústria cinematográfica e ao mundo do espectáculo; muitos outros eram cientistas, professores, sindicalistas - e, todos, suspeitos de pertencer, ter pertencido, vir a pertencer, ou simpatizar com o Partido Comunista dos EUA...

Essa primeira «Lista Negra» que, até 1952, viria a ser aumentada, incluia centenas de nomes conhecidos de actores, realizadores, escritores, músicos, entre eles:
Orson Welles, Bur Ives, José Ferrer, Lee J. Cobb, Edie Albert, Judy Holliday, Gary Cooper, Robert Taylor, Elia Kazan, John Garfield, Edward G. Robinson, Joseph Losey, Charles Chaplin, Bertolt Brecht, Jules Dassin, Robert Rossen, Martin Ritt, Arthur Miller, Howard Fast, Dashiel Hammett, Richard Wright, Irwing Shaw, Bud Schulberg, Langston Hugues, Canada Lee, Paul Robeson, Hans Eisler, Pete Seger, Aarons Copland, Abraham Polonsky, Burgess Meredith, Sterling Haiden, Leonard Bernstein
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A Comissão dispunha de uma outra «lista»: a dos bufos - gente do cinema, também, que colaborava activamente na «caça às bruxas», espiando e denunciando colegas.
Desses bufos, destacaram-se, entre vários outros, Ronald Reagan, Adolphe Menjou e Walt Disney.
(registe-se o facto, por demais significativo, de, ligados a este sinistro processo estarem dois futuros presidentes dos EUA: Nixou e Reagan - e acrescente-se o facto de o apoio de MacCarthy a Eisenhower ter vindo a ser decisivo para a eleição deste à presidência dos EUA)

Corajosas acções de solidariedade com os perseguidos e de protesto contra as práticas da Comissão, foram levadas à prática, entretanto.
Entre os que assumiram publicamente essa postura, contam-se John Huston, Howard Hawks, Lauren Bacal e Humphrey Bogart - estes dois, particularmente activos no combate à intolerância, chegaram a promover, a dada altura, rm Washington, uma marcha contra a caça às bruxas.

Muitos dos incluídos na «Lista Negra» não resistiram aos interrogatórios e confessaram o «crime», o que significou, nuns casos, confessarem o que os inquisidores queriam que confessassem; noutros casos, confessarem mais, até, do que lhes era pedido...
Outros, após terem recusado prestar declarações, vieram posteriormente a ceder, como forma de salvarem as suas carreiras, casos, entre outros, de José Ferrer, Judy Holliday, Canada Lee, Martin Ritt.
Houve ainda os que se transformaram em activos delatores, entre eles Gary Cooper, Sterking Hayden, Robert Taylor, Bud Schulberg, Elia Kazan.

Dois casos:

1 - Robert Taylor: foi chamado à Comissão porque participara, em 1944, num filme intitulado «Canção da Rússia» - filme que após o fim da guerra, passou a ser considerado como «muito perigoso», pelo facto de mostrar «russos a sorrir». Ora, segundo a Comissão, mostrar «essa gente a sorrir é fazer propaganda comunista»...
Acrescia que, no filme, o personagem desempenhado por Robert Taylor cometera o gravíssimo crime de «mostrar simpatia e sorrir para o actor que representava um camponês russo»...
No decorrer do interrogatório, Taylor declarou-se «profundamente arrependido» de ter entrado em tal filme e, para que a Comissão não tivesse dúvidas sobre o seu profundo arrependimento, informou que tinha «ouvido dizer que Howard Silva, Karen Morley, Lester Cole ( e mais uns quantos) eram comunistas»...

2 - John Garfield: é considerado um dos maiores actores da história do cinema. Celebrizado pelo desempenho de papéis em que «personificava o rebelde pertencente à classe operária», foi um predecessor de James Dean (do qual se dizia que era o «John Garfield da década de 50»).
Scorsese diz, reportando-se designadamente à interpretação de John Garfield em «Forças do Mal», que «ninguém no cinema expressou melhor do que ele o sentimento de culpa».
Denunciado à Comissão por Elia Kazan - que conhecia a sua actividade política por terem sido, ambos, militantes comunistas - John Garfield foi interrogado dezenas e dezenas de vezes e ameaçado, insultado, miseravelmente provocado pelos inquisidores fascistas.
Recusou, sempre e até ao fim, prestar quaisquer declarações.
Na sequência disso viu a sua carreira de actor completamente arruinada.
Viria a morrer em 1952, com 39 anos de idade, em circunstâncias estranhas e obviamente ligadas ao pesadelo a que estava a ser sujeito: a sua morte, de enfarte cardíaco, ocorreu quando se dirigia para mais uma sessão de interrogatórios...

O funeral de John Garfield constituíu uma impressionante manifestação em que milhares e milhares de pessoas - intelectuais, operários, empregados, sindicalistas - expressaram a sua admiração pelo talento, pela coragem, pela dignidade do jovem actor.