OS OPERÁRIOS GRITAM POR PÃO.
Os comerciantes gritam por mercados.
O sem trabalho passou fome. Agora
passa fome o que trabalha.
As mãos que estiveram pousadas no regaço, mexem-se de novo:
fazem granadas.
Bertold Brecht
Sunday 27 February 2011
DA «CARTILHA DE GUERRA ALEMû
Thursday 24 February 2011
Poema
NA PAREDE ESTAVA ESCRITO A GIZ:
«Queremos a guerra.»
O que escreveu isto
já caiu morto.
Bertold Brecht
Monday 21 February 2011
CANÇÃO DA FUNDAÇÃO DO NATIONAL DEPOSIT BANK
Pois não é?: fundar um banco
é bom para preto e branco.
Se o dinheiro se não herda,
arranjai-o; senão - merda!
Boas são pra isso acções;
melhores que facas, canhões.
Só uma coisa é fatal -
capital inicial.
Mas, quando o dinheiro falta,
donde vem, se não se assalta?
Ai! não nos vamos zangar!:
donde outros o vão tirar.
De algum modo ele viria
e a alguém se tiraria.
Bertold Brecht
Friday 18 February 2011
LOUVOR DO COMUNISMO
É razoável, quem quer o entende. É fácil.
Tu não és nenhum explorador, podes compreendê-lo.
É bom para ti, informa-te dele.
Os estúpidos chamam-lhe estúpido, e os porcos chamam-lhe porco.
Ele é contra a porcaria e contra a estupidez.
Os exploradores chamam-lhe crime.
Mas nós sabemos:
Ele é o fim dos crimes,
não é nenhuma loucura, mas sim
o fim da loucura,
Mas sim a solução,
É o fácil
que é difícil de fazer.
Bertold Brecht
Tuesday 15 February 2011
Poema
levantam-se os animais que correm os campos
ou voam por cima deles,
levantam-se os homens e as suas esperanças.
Também do chão
pode levantar-se um livro,
como uma espiga de trigo
ou uma flor brava.
Ou uma ave.
Ou uma bandeira.
José Saramago
Saturday 12 February 2011
Negócio
O resto desprezado, com o ouro,
eu o darei a quem o ouro entende.
José Saramago
Wednesday 9 February 2011
Dispostos em cruz...
Dispostos em cruz desfeitos em cruz
em cada caminho três portas fechadas
um vento de faca um resto de luz
o espanto da morte nas águas cortadas
Um corpo estendido um ramo de frutos
um travo na boca da boca do outro
o branco dos olhos o negro dos lutos
o grito o relincho e o dente do potro
As feridas do vento as portas abertas
os cantos da boda no ventre macio
as notas do canto nas linhas incertas
e o lago do sangue ao largo do rio
O céu descoberto da nuvem da chuva
e o grande arco-íris na gota de esperma
o espelho e a espada o dedo e a luva
e a rosa florida na borda na berma
E a luz que se expande no pino do Verão
e o corpo encontrado no corpo disperso
e a força do punho na palma da mão
e o espanto da vida na forma do verso
José Saramago
Sunday 6 February 2011
Cavalaria
Cheguei esporas ao cavalo
e os sentimentos exaustos
deram saltos no regalo
das gualdrapas e dos faustos
A relva cheirava a palha
desmanchei rosas vermelhas
mas pasto foi maravalha
sabia ao sarro das selhas
Porque o cavalo era eu
o cansaço e as esporas
tudo eu e a cor do céu
mais o sonho das amoras
Relinchos eram os versos
com jeito de ferradura
que fazia por dar sorte
mas tantos foram reversos
que o ventre de serradura
deu o estoiro e deu a morte
Cai a montada no chão
cai por terra o cavaleiro
que era eu (como se viu)
da escola de equitação
vim ao saber verdadeiro
das transparências do rio
Agora dentro do barco
nos remos brancas grinaldas
tenho os teus braços em arco
como um colar de esmeraldas
José Saramago
Thursday 3 February 2011
TENHO A ALMA QUEIMADA...
Tenho a alma queimada
por saliva de sapo
Fingindo que descubro
tapo
A palavra me infecta
sob a pele da aparência
Deito o remédio certo
paciência
Neste mal não se vive
mas também ninguém morre
Quando a ave não voa
corre
Quem às estrelas não chega
pode vê-las da terra
Quem não tem voz de cantar
berra
José Saramago
Tuesday 1 February 2011
NEM SEMPRE A MESMA RIMA
Bem couraçado na pele
não sou eu mas aparência
e se me rasgo e me mostro
nem assim sou evidência
Porque os acertos em mim
são cartas de paciência
baralho caído ao chão
levantado sem prudência
Sobre a mesa verde-negra
corre um jogo de demência
passo corto pego e bato
com um parceiro de ausência
Assim jogava e perdia
que perder é uma ciência
a que a gente se habitua
sem temor nem violência
Agora que o vento arrasta
as cartas e os vícios delas
ficaram-me as mãos libertas
é manhã abro as janelas
José Saramago