Wednesday 30 September 2009

O CANTO DA ESTRELA

Sobre o sangue, em charcos, no sendeiro,
já semeado de crimes e de espanto,
a estrela redentora com seu canto
brilhou num céu claro de Janeiro.
Desperta, limpa, pura, e pela força
de Fidel e do seu povo suspensa,
já nada haverá que o seu caminho torça
nem que brilhar, em toda a luz, impeça.

Em toda a luz de honra e de decoro
e jamais rebaixada e de joelhos.
A besta negra que a noventa milhas,
do lodo putrefacto do seu oiro,
a nossa Pátria, por pequena, ofende
e por livre maltrata e insulta,
não mediu o tamanho da estrela
que em seu sangrento triângulo se acende.

A guerra imperialista que a espia
desde a podridão da sua escória,
verá que sua medida não está feita
senão à medida da vitória.
O gigante Golias foi tombado
por David, cuja funda enfurecida
tem agora o nosso povo armado
e da Praia Girón sabe a medida.

Do heróico triângulo em que cintila
a sua luz, a estrela como nunca brilha,
e ante o imperialismo não se humilha,
não se humilha jamais e nem se curva.

Já da liberdade das montanhas
é mais firme a luz que lança.
Se o ianqui nos invade, saberá
como é a chama desta estrela!

Nenhuma força haverá que a derrube
nem que lhe imponha jugos ou cadeias,
porque todo o seu fogo o recebe
da torrente viril das nossas veias.
E embora partida e feita em estilhas
essa estrela, a luz que ela derrama
sempre erguerá a redentora chama
sobre a morte e sobre as cinzas!

Manuel Navarro Luna

Sunday 27 September 2009

COM ILUSÕES OU NÃO...

Com ilusões ou não,
venha o futuro,
pois por enquanto, ao menos,
não é escuro.

Armindo Rodrigues

Thursday 24 September 2009

LIBERDADE SEM PÃO...


Liberdade sem pão não é liberdade.
Sem liberdade, o pão é escuro e amargo.
Enquanto a alvorada é uma rosa branca,
o pino da tarde é um toiro bravo.
Entre o destino aceite e o escolhido,
é o mais custoso o que mais me quadra.
Pode viver-se preso e ser-se livre.
Pode viver-se livre e ser-se escravo.

Armindo Rodrigues

Monday 21 September 2009

OS CÃES DA INFÂNCIA

São os cães da infância os cães dementes
ladrando-me às canelas do passado
cães mordendo-me a vida com os dentes
ferrados no meu sexo atormentado.

Paguei cada minuto do presente
com vergões de amor próprio vergastado
porém só fala quem se não consente
vencido temeroso ou amarrado.

Contra os cães uivo. Não me fico assim.
Não tenho pai nem mãe. Nasci de mim
macho e fêmea gerando o desespero.

Lutar é tudo quanto sou capaz.
Não me pari para viver em paz.
Tudo o que eu sou é menos do que eu quero.

José Carlos Ary dos Santos

Friday 18 September 2009

RECOMEÇA...

Se puderes
sem angústia
e sem pressa.
E os passos que deres
nesse caminho duro
do futuro,
dá-os em liberdade.
Enquanto não alcances
não descanses.
De nenhum fruto queiras só metade.

E, nunca saciado,
vai colhendo ilusões sucessivas no pomar.
Sempre a sonhar e vendo
o logro da aventura.
És homem, não te esqueças!
Só é tua a loucura
onde, com lucidez, te reconheças...

Miguel Torga

Tuesday 15 September 2009

O Vosso tanque General, é um carro forte

Derruba uma floresta esmaga cem
Homens,
Mas tem um defeito
- Precisa de um motorista

O vosso bombardeiro, general
É poderoso:
Voa mais depressa que a tempestade
E transporta mais carga que um elefante
Mas tem um defeito
- Precisa de um piloto.

O homem, meu general, é muito útil:
Sabe voar, e sabe matar
Mas tem um defeito
- Sabe pensar


Bertold Brecht

Saturday 12 September 2009

Perguntas de um Operário Letrado

Quem construiu Tebas, a das sete portas?
Nos livros vem o nome dos reis,
Mas foram os reis que transportaram as pedras?
Babilónia, tantas vezes destruida,
Quem outras tantas a reconstruiu? Em que casas
Da Lima Dourada moravam seus obreiros?
No dia em que ficou pronta a Muralha da China para onde
Foram os seus pedreiros? A grande Roma
Está cheia de arcos de triunfo. Quem os ergueu? Sobre quem
Triunfaram os Césares? A tão cantada Bizâncio
Sò tinha palácios
Para os seus habitantes? Até a legendária Atlântida
Na noite em que o mar a engoliu
Viu afogados gritar por seus escravos.

O jovem Alexandre conquistou as Indias
Sózinho?
César venceu os gauleses.
Nem sequer tinha um cozinheiro ao seu serviço?
Quando a sua armada se afundou Filipe de Espanha
Chorou. E ninguém mais?
Frederico II ganhou a guerra dos sete anos
Quem mais a ganhou?

Em cada página uma vitòria.
Quem cozinhava os festins?
Em cada década um grande homem.
Quem pagava as despesas?

Tantas histórias
Quantas perguntas

Bertold Brecht

Wednesday 9 September 2009

Elogio da dialéctica

A injustiça avança hoje a passo firme
Os tiranos fazem planos para dez mil anos
O poder apregoa: as coisas continuarão a ser como são
Nenhuma voz além da dos que mandam
E em todos os mercados proclama a exploração;
isto é apenas o meu começo

Mas entre os oprimidos muitos há que agora dizem
Aquilo que nòs queremos nunca mais o alcançaremos

Quem ainda está vivo não diga: nunca
O que é seguro não é seguro
As coisas não continuarão a ser como são
Depois de falarem os dominantes
Falarão os dominados
Quem pois ousa dizer: nunca
De quem depende que a opressão prossiga? De nòs
De quem depende que ela acabe? Também de nòs
O que é esmagado que se levante!
O que está perdido, lute!
O que sabe ao que se chegou, que há aì que o retenha
E nunca será: ainda hoje
Porque os vencidos de hoje são os vencedores de amanhã


Bertold Brecht

Sunday 6 September 2009

Dificuldade de governar

1

Todos os dias os ministros dizem ao povo
Como é difícil governar. Sem os ministros
O trigo cresceria para baixo em vez de crescer para cima.
Nem um pedaço de carvão sairia das minas
Se o chanceler não fosse tão inteligente. Sem o ministro da Propaganda
Mais nenhuma mulher poderia ficar grávida. Sem o ministro da Guerra
Nunca mais haveria guerra. E atrever-se ia a nascer o sol
Sem a autorização do Führer?
Não é nada provável e se o fosse
Ele nasceria por certo fora do lugar.

2

E também difícil, ao que nos é dito,
Dirigir uma fábrica. Sem o patrão
As paredes cairiam e as máquinas encher-se-iam de ferrugem.
Se algures fizessem um arado
Ele nunca chegaria ao campo sem
As palavras avisadas do industrial aos camponeses: quem,
De outro modo, poderia falar-lhes na existência de arados? E que
Seria da propriedade rural sem o proprietário rural?
Não há dúvida nenhuma que se semearia centeio onde já havia batatas.

3

Se governar fosse fácil
Não havia necessidade de espíritos tão esclarecidos como o do Führer.
Se o operário soubesse usar a sua máquina
E se o camponês soubesse distinguir um campo de uma forma para tortas
Não haveria necessidade de patrões nem de proprietários.
E só porque toda a gente é tão estúpida
Que há necessidade de alguns tão inteligentes.

4

Ou será que
Governar só é assim tão difícil porque a exploração e a mentira
São coisas que custam a aprender?


Bertold Brecht

Thursday 3 September 2009

Nada é impossível de mudar

Desconfiai do mais trivial, na aparência singelo.
E examinai, sobretudo, o que parece habitual.
Suplicamos expressamente: não aceiteis o que é de hábito como coisa natural, pois em tempo de desordem sangrenta, de confusão organizada, de arbitrariedade consciente, de humanidade desumanizada, nada deve parecer natural nada deve parecer impossível de mudar.

Bertold Brecht

Tuesday 1 September 2009

ALEMANHA

Em noite de vento, em noite escura,
um raminho floriu.
Com medos acordei na noite escura
e vi que o raminho floriu.

O espantalho de Hitler, o espantalho sangrento,
o vento um dia o dissipará:
«Hitlers vêm e Hitlers vão,
mas o povo alemão ficará» (1)

O Hitler será escorraçado
se nós nos soubermos unir,
e a nossa Alemanha querida
outra vez há-de florir.

Bertold Brecht

(1) A citação é de um discurso de Estáline.