Saturday 15 February 2014

TODAS AS FERRAMENTAS DO HOMEM


Aqui estão todas as ferramentas deste mundo,
todas as ferramentas que o homem fez
para se firmar bem neste mundo.
Aqui estão as navalhas de gume fino com que
fazemos a barba ao tempo.
E aqui as tesouras para cortar o pano,
para cortar os hipogrifos e as flores
e cortar as máscaras e todas as tramas e, por fim,
para cortar a própria vida do homem, que é um fio.
Aqui estão as serras e serrotes - também facas
sem dúvida, mas imaginadas
de tal modo que os próprios defeitos do borde sirvam
o seu fim.
E aqui está uma colher que alude aos princípios
e aos fins e em resumo
ao inqualificável desvalimento do homem.
Aqui está um fole para atiçar o fogo que serve para
animar o ferro
que serve para fazer o machado
com que se corta a generosa cabeça do homem.
Aqui está um compasso que mede a beleza justa
para que não ultrapasse e quebre e desfaça
o humilde coração do homem.
E aqui está uma trolha de pedreiro com que se unem
os materiais necessários
para que seja feliz e se proteja
de todo o dano.
Aqui está uma balança, chaves, canivetes e binóculos
(se é que o são, que não se sabe)
que na realidade não servem para nada senão para estabelecer
de uma vez para sempre a sólida posição do homem.
Aqui estão uns óculos que se têm de usar para ver
se já se fez o imaginável, o previsível, simples e
impossível
para tratar de garantir todas as ferramentas do homem.

E aqui está, finalmente, o almofariz a que confiamos
a mistura
com que uniremos os pedaços, migalhas, minúcias e despojos
se é que por fim e a tempo, se é que às cegas e por fim
não aprendemos a usar, domar, suavizar e manejar
todas as ferramentas do homem.

Eliseo Diego