Monday, 3 November 2025

A LIGA

 
Louva-a-deus martins agarrou o marido pela cintura,
enlaçou-o ternamente, acariciou-o e fez amor com ele
até atingir o orgasmo. Depois, como é normal entre os
louva-a-deus, ele, submisso e resignado, entregou-se
inteirinho para que ela o devorasse, e assim sucedeu:
louva-a-deus martins foi retraçando o companheiro
com os seus finíssimos dentes, lenta e ritualmente, até
que dele nada restou senão uma ligeira azia que a ter-
rível amante combateu com duas ou três dentadinhas
numa folha de hortelã. Ah!..., suspirou ela, que destino
o meu!... Amar é a minha perdição!... E, rapidamente,
convocou as outras louva-a-deus para uma reunião
extraordinária, que veio a realizar-se no cimo de um
loureiro, de onde ninguém saiu sem que ficassem apro-
vados os estatutos da nova-liga-feminina-para-a-defe-
sa-dos-machos. Machistas!, gritaram no final, em coro,
as não aderentes, de temperamento mais ardente, ou
de maior apetite. E, a partir daí, naquele imenso cam-
po de girassóis, as louva-a-deus ficaram divididas (até
quando?) em duas espécies: as que comem os machos
e as que se deixam comer.
Joaquim Pessoa
In Histórias Fabulosas, PORTUGUÊS SUAVE