Thursday, 30 January 2025

- sem título -

 
o sol hoje nasceu de noite
ou então não surgiu pela alvorada.

Miguel Tiago

Monday, 27 January 2025

poema passageiro

 
dentro meu peito vivem animais
de garras dilacerantes.
dentro do meu peito batem asas
morcegos ou vampiros.
porquanto a dor nos consome as veias,
e o negro nos cobre as almas,
tudo é escuro, como a negritude.
vale-nos que nascerá da esterilidade
sempre
o sorriso de existir e poder sentir
que não há sentido na luz se não vivermos a escuridão.

Miguel Tiago

Friday, 24 January 2025

24 de janeiro

 
quando do chão os rostos se levantam,
redobram-se as forças que trazemos nos punhos.

sendo fortes, mais humanos nos tornamos,
e é na rocha mais dura que se apura a dureza do aço.

dos desânimos faremos lanças,
das insuficiências, desafios,
da confiança, vitórias.

Miguel Tiago

Tuesday, 21 January 2025

- sem título -

 
já não há andorinhas
e ninguém me diz porquê.

Miguel Tiago

Saturday, 18 January 2025

vendavais do tempo

 
enquanto se esvai o tempo,
como areia de um deserto ao vento,
dobram-se cabos de tormentas,
redobram-se forças e revoltas.

que essa areia assentará sempre algures,
no futuro,
algures,
sempre.

Miguel Tiago

Wednesday, 15 January 2025

os vampiros

 
não nos basta saber
que nos roubam o pão,
que contra nós
conspiram escondidos
os parasitas e os assassinos.
não nos basta saber
que morrem de fome os nossos irmãos,
e que os homens livres morrem na prisão.

não nos basta saber que os vampiros
morrem quando param de chupar-nos o sangue,
é preciso querer e fazer com que eles parem.

Miguel Tiago

Sunday, 12 January 2025

esgota-se o tempo

 
já não há tempo para que a poesia se dê ao luxo
de passear nos bosques encantados e nos egos poluídos
dos intelectuais de escrivaninha.

já não há tempo para que os versos se ostentem,
bem rimados, construídos, bem ritmados, bonitos,
nos corações vazios da burguesia.

é urgente que as palavras ganhem o peso das pedras,
se revoltem com os que vivem sem poesia e sem pão.
não há tempo para brincar aos poetas, ao depressivo snob en vogue.

só nos resta tempo para que se não nos acabe o tempo,
para que gritemos ainda que não abdicámos do futuro,
com propriedade, ou mesmo sem.

Miguel Tiago

Thursday, 9 January 2025

triunfo

 
aqueles que nos construíram o mundo
de hoje e do passado,
não poderiam perdoar que não erguêssemos nós o de amanhã.

Miguel Tiago

Monday, 6 January 2025

sem título

 
ser poeta não é ser maior do que os homens.

Miguel Tiago

Friday, 3 January 2025

parasita

 
já nos dói a vida do dia-a-dia,
de ficar mais pobre neste sol
que estava ainda na anterior lua.

pago eu a tua barriga gorda,
o inchaço dos teus bolsos,
com a fome dos meus filhos
e minha barriga vazia.

pago com os calos das minhas mãos,
a finura dos teus dedos;
com o suor do meu corpo,
o fresco conforto do teu ar condicionado;

pago com as noites mal dormidas,
o teu sono descansado;
com a renda da minha casa,
as obras que nela nunca fizeste;
pago com o meu desespero,
o teu opulento descanso.

e de tudo quanto faço,
me roubas o maior pedaço.

roubas, roubas, roubas
e vives acima do que posso pagar-te,
bicha solitária, filha da puta.

Miguel Tiago

Wednesday, 1 January 2025

sem título

 
sabemos que o mundo muda, constante, embora lentamente. mas satisfaz-nos saber que, no derradeiro dia, estivemos do lado do progresso e da mudança e não do retrocesso ou paralisação.

sabemos que é difícil a luta, empolgante, porém. mas é-nos grato abraçar quem nela caminha a nosso lado e levanta alto o punho da transformação.

não podemos conhecer o caminho, tampouco saber quanto dele está por percorrer. todavia, o mais importante é termos a certeza de que esse caminho aí está, inevitável.

que melhor fim pode ter um ser humano que não ser, isso mesmo, humano.

Miguel Tiago