Wednesday 30 November 2011

Expulso, e com razão


Eu cresci como filho
de gente abastada. Os meus pais puseram-me
um colarinho ao pescoço e criaram-me
nos costumes de ser servido
e ensinaram-me a arte de mandar. Mas
quando já era crescido e olhei à minha roda,
não me agradou a gente da minha classe,
nem o mandar nem o ser servido.
E eu abandonei a minha classe e juntei-me
à gente pequena.

Assim
criaram eles um traidor, educaram-no
nas suas artes, e ele
atraiçoa-os ao inimigo.

Sim , eu divulgo segredos. Entre o povo
estou eu e explico
como eles enganam, e predigo o que vai vir, pois eu
estou iniciado nos seus planos.
O latim dos seus padres corruptos
traduzo-o palavra a palavra para a língua comum,
e então se descobre que é tudo pantomina.
A balança das sua justiça
tiro-a pra baixo e mostro os pesos falsos.
E os seus informadores vão dizer-lhes
que eu estou com os roubados que conjuram
a revolta.

Admoestaram-me e tiraram-me
o que ganhei com o meu trabalho. E quando eu não melhorei,
deram-me caça, porém
já só havia
escritos em minha casa, que descobriam
os seus conluios contra o povo. E assim
perseguiram-me com um mandato de captura
que me acusava de opiniões baixas, isto é:
de opiniões dos de baixo.

Aonde chego, fico marcado
pra todos os possidentes, mas os que nada têm
lêem o mandato e
dão-me abrigo.
«A ti» - ouço eu dizer -
«Expulsaram-te eles, e
com razão».


Bertold Brecht